IN MEMORIAM
Frei Helano recupera para a nossa memória o testemunho de um confrade nosso frente aos conflitos de nosso tempo.
Frei Lamberto - para muitos um grande desconhecido - nasceu em Amsterdão a 21-07-1899; entrou na Ordem a 07-09-1920 e foi ordenado sacerdote em Weert a 27-03-1927. No mesmo ano, no dia 3 de outubro, chegou ao Brasil, onde seu nome Frei Beato foi mudado em Frei Lamberto van Beckhoven. Aqui trabalhou em Teófilo Otoni (1927), Itaipé-Caraí (1929), Ouro Preto (1931); foi um dos nossos primeiros lentes de Dogmática, História e Português, em Divinópolis (outubro de 1931 a junho de 1932), quando voltou para Ouro Preto, onde ficou até a entrega da Paróquia em junho de 1933. Foi então como coadjutor para Corinto (05-06-33), Carlos Prates (26-10-34) e ainda para Cordisburgo, onde foi ao Norte de Minas em campanha de colocar ações e assinaturas de "O Diário" católico de Belo Horizonte.
Nesse inquietante vai vêm de lugares e encargos, quase foi ser pároco de Alvinópolis, mas o próprio Dom Helvécio, de Mariana, lho desaconselhou e o nosso Frei Serafim, de saudosa memória, conseguiu convencê-lo a voltar para a Holanda, onde chegou ao provincialado em março de 1935. Depois, tivemos poucas notícias dele. O seu tão resumido "In Memoriam" (Santa Cruz, 1945, p. 175) conta o supra referido, que era bom pregador em português clássico e que faleceu no campo de concentração de Belsen - o mais cruel - no ano de 1945, sem se saber o dia nem o modo de seu falecimento. Frei Olavo acha que foi mais ou menos no dia 20 de fevereiro. A lista dos 2.500 franciscanos holandeses falecidos entre 1853 e 1977, feita pelo Frei J. A. Kok - atualmente bispo-auxiliar em Utrecht-Holanda -, acha que foi em 15-03-1945 (p. 57, n° 1.072).
Outro dia, lendo no "Variant" (1984, p. 93) o necrológio de Frei Marcus Janssens, escrito por Frei Nicomedes Kamphuis, fui surpreendido pela passagem seguinte: "Uma situação crítica em Heerlen foi a prisão de Frei Beato (Lamberto) Imediatamente (05-05-84), escrevi ao necrologista para outras informações a respeito de Frei Lamberto. Já no dia 20 de maio, este me respondeu: "De fato, conheci Frei Lamberto ligeiramente. Mas o que pude achar na "Neerlandia Seraphica", no volume de 1942 a 1946 a respeito dele, copiei. Ali, decerto, não consta tudo, podendo ainda indagar mais eventualmente no arquivo provincial
O que Frei Nicomedes me mandou, conta boa disponibilidade, são, de fato, diversas cartas do Padre Provincial Frei Prudêncio van Leusden, publicadas nesse volume-guerra da N. S., cujos dados ordenei cronologicamente.
- .. em março de 1935, voltou ele para a Holanda, onde, por algum tempo, foi assistente paroquial em Weert e, desde agosto de 1936, coadjutor em Heerlen Laandertraat" (13-06-45, N. S., p. 209).
-.. Frei Lamberto parece ter feito alguma coisa, pela qual não gostaria de ser chamado a responsabilizar-se: a 3 de fevereiro (1944) sumiu de Heerlen. Bem depressa veio a polícia procurá-lo. Sem resultado. A casa toda foi vasculhada e ficou ocupada pelo resto do dia. Na noite de 5 para 6 da fevereiro, voltaram. Então levaram o nosso irmão Frei Marcus Janssens que, até o dia 7 de fevereiro, ficou preso no nosso convento (agora cadeia) de Maastricht. Depois o soltaram. Dez dias depois (17 de fevereiro), chegou aquela visita outra vez: duas pessoas, à paisana. Levaram o Pe. Reitor Caetano Reiber... como refém... supomos pelo inatingível Frei Lamberto... (N.S., 27-02-44, p. 115).
- .. Presos... Frei Lamberto foi detido no dia 08-06-44 e por aí também Frei Sebaldo Linders, e no dia 14 também Frei Bertrando van Bilsen, no trem entre Roermond e Sittard; esse esteve com Frei Lamberto em Maastricht" (25-06-44; N. S. p. 138).
-.. Frei Lamberto estaria em Bught..." (08-08-44; N.S., p. 145).
- "07-09-44: bodas de prata de vida franciscana de Frei Lamberto van Beckhoven, João Brouwer, Olavo Timmers, Levino Pothof, Angelino Steverink e mais quatro (12-44; N. S., p. 172).
- "Começo de setembro de 1944, Frei Lamberto, com outros presos, foi levado para Sachsenhausen-Oraniënburg (campo de trabalhos); e fins de setembro, foi ele com mais outros, mandado para a fábrica Heindel. Ali, ele já tava bem doente e por isso foi mandado de volta para Sachsenhausen-Oraniënburg, onde os velhos e doentes recebiam um 'tratamento'... mortífero! (02-08-45; informante Sr. A. J. L. Juten, em carta ao Pe. Vigério Frei Germano Vrijmoed; N.S., p. 218).
Daquele lugar perigoso, porém, Frei Lamberto entreteve correspondência com "o Pe. Frei Leo van Eekeren... da Noruega... duas cartinhas, datadas de 8 de dezembro de 1944 e de 21 de janeiro de 1945, ambas de Sachsenhausen-Oraniënburg. Frei Leo correspondeu com ele e teve também a oportunidade de lhe mandar umas coisas (04-10-45; N.S., p. 237).
Pouco depois, apesar de estar dente, ainda foi transferido para o horrível campo de concentração de Belsen, onde achou a morte, pois "os padres que estavam na Alemanha, seja como presos, seja como operários, voltaram para a Província. Uma boa notícia, se isso pudesse afirmar a respeito de todos. Agora, infelizmente, parece certo que Frei Lamberto não volta mais. Embora não recebesse comunicação oficial, contudo, numa lista de falecidos em Belsen (no qual, sem embargo, podemos acreditar), consta o nome dele... Humildemente queremos submeter-nos às determinações divinas, agora que ele, após Frei Sebaldo (falecido a 11-09-45), nos pediu outra vítima em Frei Lamberto. Quando ele morreu, não o sabemos. Em todo caso, depois de 5 de fevereiro deste ano de 1945. Também não sabemos como ele morreu. Que ele descanse em paz e que o sacrifício, que ele ofereceu, nos fortaleça em nossa fidelidade a Deus e à Pátria... Que Deus tenha aceito suas atividades em defesa da Pátria, como ela as intencionou (13-06-45; N. S., p. 205 e 209).
- .. A respeito das suas boas intenções, dá testemunho o que um Padre Carmelita escreveu ao Pe. Reitor Caetano Reiber. Certo dia, Frei Lamberto lhe perguntara: 'Se eles me pegarem, então me bastará suportar com paciência para o perdão dos meus pecados e pela salvação das almas? '" (02-08-45: N.S., p. 218).
Conclusão: Afinal de contas, com todas essas cartas, ainda não fiquei sabendo nem o dia nem o modo da morte do nosso confrade Frei Lamberto. Mas fiquei muito satisfeito e mesmo edificado em saber da sua ótima disposição de tentar "suportar tudo com paciência..." Ainda não sei se ele deu conta, como o deu a Frei Tido Brandsma que, em breve, será canonizado. Permita Deus que ele tenha dado conta de "suportar tudo com paciência Então, acho eu, deveríamos chamá-lo de Frei Beato, no bom sentido.
Por Frei Helano van Koppen
Fonte: Revista dos Franciscanos da Província Santa Cruz, 1984, p. 295 a 298.
